Em 1996, movimentos sociais de trabalhadores adotaram o dia 28 de abril como o Dia Internacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho, com o objetivo de prestar honra aos que morreram ou adoeceram em virtude de más condições de trabalho e mobilizar a sociedade na defesa de um trabalho mais saudável e seguro. Em 2003, a Organização Internacional do Trabalho, em parceria com empregadores e trabalhadores, elegeu a data como o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho. No Brasil, o dia foi oficializado, em 2005, como celebração nacional e o movimento Abril Verde, recentemente, ganhou força na luta pela saúde e segurança no trabalho.

Apesar dos avanços, temos pouco para celebrar e muito a lamentar em 2018. Isso porque, em novembro de 2017, a Lei nº 13.467, que ficou conhecida como “reforma trabalhista”, exagerou na dose da flexibilização dos vínculos e condições de trabalho, chegando a ponto de permitir que mulheres grávidas ou que estejam amamentando possam trabalhar em ambientes insalubres, ou seja, que sabidamente tenham riscos para a saúde de quem trabalha. Diante de excessos como esse, o Governo Federal emitiu a Medida Provisória 808/17 para ajustar alguns avanços considerados inaceitáveis pela sociedade, dentre eles a permissão do trabalho de mulheres grávidas e gestantes em condições que pudessem colocar em risco a sua saúde ou do concepto. No entanto, a MP 808/17 acaba de caducar, sem que a Câmara de Deputados fizesse menção alguma sobre sua votação nos últimos quatro meses. Desde 24 de abril, passa a valer a Lei nº 13.467, com seu texto original, que permite o trabalho da gestante ou lactante em condições insalubres, a menos que um atestado de saúde, emitido por médico de sua confiança, recomende o afastamento durante a gestação. Não é preciso ser um especialista para saber que, diante das altas taxas de desemprego, dificilmente essas mulheres apresentariam atestados com “prazo de validade”. Elas sabem que podem ser demitidas quando voltarem da licença maternidade, caso busquem afastamento durante a gestação. Sobre as mães que amamentam, nenhuma menção na lei, deixando essas mulheres completamente desprotegidas. O pior é que isso acontece em um país onde ainda se luta por um melhor planejamento familiar, um pré-natal que atenda, minimamente, ao protocolo do SUS – Sistema Único de Saúde, e no qual o desmame precoce é uma das maiores causas de adoecimento e internações no primeiro ano de vida.

A Lei nº 13.467, conhecida como “reforma trabalhista”, exagerou na flexibilização das condições de trabalho, chegando a permitir que mulheres grávidas ou que estejam amamentando trabalhem em ambientes insalubres.

Alguns setores econômicos defendem a Lei 13.467 , alegando que o afastamento das gestantes do trabalho insalubre comprometeria a produtividade, especialmente de segmentos onde a mão-de-obra feminina é majoritária como, por exemplo, nos serviços de saúde. Ainda, que há um exagero nos critérios que definem o pagamento do adicional de insalubridade e, portanto, não haveria risco significativo. Neste ponto, olhar para uma perspectiva internacional pode ser bastante útil.

Até mesmo o maior país capitalista do mundo e, portanto, preocupado em maximizar a produtividade, procura preservar a saúde reprodutiva. Nos Estados Unidos, o CDC – Centers for Disease Controland Prevention publicou diretrizes a respeito e que estão disponíveis gratuitamente, em inglês. Por meio do National Institute for Occupational Safetyand Health (NIOSH), trabalhadores, empregadores e profissionais de saúde recebem orientações sobre como proteger a saúde reprodutiva das mulheres no trabalho e, consequentemente, a saúde de seus filhos.

A OIT defende a luta contra o trabalho infantil e pela defesa de um trabalho mais seguro e saudável para jovens trabalhadores.

Sobre o adicional de insalubridade, vale lembrar que seu surgimento é datado do início da Revolução Industrial, no século XVII, visando melhorar o rendimento de trabalhadores que enfrentavam jornadas de até 16 horas diárias. Em um primeiro momento, todos aprovaram a ideia. Trabalhadores porque tiveram um aumento de renda; empregadores porque não precisavam investir em medidas de proteção. Com o tempo, os dados mostraram que o adicional era um equívoco porque o custo social das mortes e do adoecimento era muito alto para o país. Foi assim que vários países, como a Inglaterra, aboliram o adicional de insalubridade.

No Brasil, a monetização do risco acabou infelizmente prevista na própria Constituição Federal. O artigo 7º estabelece que os trabalhadores têm direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho (inciso XXII), ao mesmo tempo em que permite o adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (inciso XVIII). Ou seja, em uma lógica perversa, nossa constituição cidadã permite que o empregador não invista em melhorias nas condições de trabalho que possam provocar agravos à saúde, em troca de uma indenização antecipada e parcelada paga aos trabalhadores expostos a reconhecidos riscos de morte e doença. Uma situação inaceitável em qualquer país civilizado.

Em 2018, o tema do dia 28 de abril foi “Geração Segura e Saudável”. Com essa proposta, a OIT defende a luta contra o trabalho infantil e pela defesa de um trabalho mais seguro e saudável para jovens trabalhadores. Entretanto, tomamos a liberdade de ir além ou, neste caso, voltar para muito antes. É preciso defender a proteção das novas gerações desde a vida intrauterina, avançando para os primeiros meses de vida. Que todas as pessoas e, em especial, as mulheres gestantes e lactantes tenham o direito a um trabalho digno, em que não coloquem sua vida e saúde em risco, e muito menos a de seus filhos, futuros brasileiros e brasileiras que poderão fazer deste, um país melhor. Se não for assim, o 28 de abril deixará de ser um dia de luta, para se transformar em um dia de luto.