Com o início da pandemia, o governo editou a Medida Provisória nº 927 de 22/03/20, e em seu artigo 29, dispunha que os casos de contaminação pelo novo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal. Mas o STF suspendeu a eficácia do artigo em caráter liminar, por decisão proferida no julgamento das ADIs nº. 6344, 6346, 6348, 6349, 6352 e 6354, considerando que é responsabilidade das empresas adotarem todas as medidas preventivas para evitar a infecção pela doença, levando em consideração que a atribuição do ônus probatório ao empregado não seria medida adequada à redução dos riscos dos trabalhadores diante da doença.

A MP 927 teve sua aplicação encerrada sem conversão em lei, e as referidas ADIs perderam objeto, mas a questão continuou a ser foco de dúvidas e questionamentos por todos os profissionais do meio.

Acontece que, em dezembro do ano passado o Ministério da Economia emitiu a Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME, onde orienta que a COVID-19 pode ser reconhecida como doença ocupacional, aplicando-se o que é dito no segundo parágrafo do artigo 20 da Lei 8.213/91, quando a doença resultar das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relacionar diretamente; ela ainda pode se constituir como  um acidente de trabalho por doença equiparada, caso a doença seja proveniente de contaminação acidental do empregado pelo vírus, no trabalho.

No entanto, essa categorização só existe se a Perícia Médica Federal constatar tecnicamente a identificação do nexo causal, não agindo em favor do empregado, a princípio, presunção legal de que a contaminação constitui-se em doença ocupacional.

Contudo, o Ministério Público do Trabalho também emitiu Nota Técnica GT COVID-19 20/20, recomendando a emissão do CAT para todos os funcionários que sejam contaminados pelo coronavírus, inclusive aqueles que estiverem apenas sob uma condição de suspeita por critério clínico-epidemiológico.

A contradição entre as notas técnicas de seus respectivos órgãos emissores reflete na tomada de ação em decisões judiciais. Mas, não possuem força coercitiva e vinculante, motivo pelo qual o entendimento jurisprudencial sobre o tema deve aclarar a situação de acordo com a especificidade de cada situação.

Recentemente, a Justiça do Trabalho de Minas Gerais reconheceu como acidente de trabalho a morte por COVID-19 de um motorista de caminhão. A transportadora que o empregava foi condenada a pagar indenização de R$200 mil por dano moral aos familiares e pensão para a filha até que ela complete 24 anos. O juiz da Vara do Trabalho de Três Corações (MG) concluiu que a empresa fosse responsabilizada, tendo o dever de assumir o risco por eventuais infortúnios sofridos pelo empregado ao submetê-lo ao trabalho durante período agudo da pandemia, uma vez que o funcionário teria sido contaminado no exercício da função, durante uma viagem de dez dias de Minas Gerais a Pernambuco, estando vulnerável aos ambientes a que se submetia.

Já em outro caso, o juiz da 36º Vara do Trabalho de São Paulo, negou liminar pretendida por trabalhador, decidindo que o enquadramento do contágio por COVID-19 como doença ocupacional não decorre de nexo causal presumido, sendo que seu reconhecimento como acidente de trabalho demanda a análise ampla do caso concreto (Proc. 1000960-48.2020.5.02.0036, DEJT de 29/10/2020).

Considerando todos os casos acima citados, percebe-se que a caracterização da COVID-19 como doença ocupacional/acidente do trabalho depende das circunstâncias de cada ocorrência, levando-se em conta a forma e as condições nas quais o empregado trabalha, se o empregador adotou as medidas preventivas contra a contaminação e a realização de perícia técnica médica, quando necessário.