Ao longo da história da emergência sanitária da Covid-19 no Brasil, especialmente nas suas fases mais agudas, o debate sobre uso de máscaras de tecido sempre causou muita celeuma no que se refere à eficiência deste tipo de insumo para contenção, prevenção e mitigação da transmissão da doença.
A celeuma reside na interpretação equivocada de que máscaras de tecido podem ser aplicadas como sucedâneo ou alternativa aos equipamentos de proteção individual, notadamente equipamentos de proteção respiratória.
As máscaras de tecido, por um lado, não são e nem podem ser consideradas como equipamento de proteção individual alternativo aos protetores respiratórios certificados pela autoridade competente, pois sua eficiência para bloquear a cadeia de transmissão é significativamente inferior às máscaras respiratórias do tipo N95 ou PFF2 e similares.
Por outro lado, não se pode recusar ao uso das máscaras de tecido a funcionalidade de cobrir a boca e o nariz de uma pessoa infectada, sintomática ou não, reduzindo a dispersão de gotículas contendo o novo coronavírus no ambiente.
Esse é justamente o conceito de etiqueta respiratória: ações ou medidas direcionadas à redução da dispersão de gotículas produzidas pelo organismo humano ao espirrar ou tossir.
Além dessa funcionalidade, as máscaras de tecido, devidamente manuseadas e higienizadas, têm influência comportamental (indivíduos infectados ou saudáveis) não apenas por permitir que a pessoa que utilize a máscara reduza o contato das próprias mãos com as mucosas da boca e do nariz, mas também para fomentar a consciência coletiva de que a pandemia é fenômeno sanitário sem data marcada para seu encerramento.
A toda evidência, nenhuma das funcionalidades acima autoriza a conclusão de que máscara de tecido tem característica de equipamento de proteção individual na acepção técnica de EPI.
O equipamento de proteção individual, insumo de segurança de trabalho e saúde dos trabalhadores e trabalhadoras, ao contrário das máscaras de tecido, é ação técnica que deve ser adotada de acordo com as prescrições dos serviços médicos que prestam assessorias a organizações empresariais, observado o grau de risco da atividade onde ocorrerá a exposição ao agente biológico e sob responsabilidade técnica de profissional habilitado.
Portanto, as máscaras de tecido, associadas às medidas de biossegurança previstas em protocolos sanitários em geral, podem (e devem) contribuir nos planos públicos e privados de contingenciamento do risco da Covid-19 como medida de etiqueta respiratória.
Contrário senso, as máscaras de tecido não podem e não devem ser caracterizadas, interpretadas ou utilizadas como sucedâneo ou alternativa aos equipamentos de proteção individual do tipo máscaras respiratórias previstos tecnicamente nos programas de gerenciamento de risco biológico para trabalhadores e trabalhadoras expostos em razão do trabalho ou atividade profissional.
Coautoria: Dr. Marcos Oliveira Sabino. Médico de Saúde Pública do Cerest / SUS Campinas. Analista em Medicina do MPU / MPT . Mestre em Saúde Coletiva – Unicamp e Professor – Medicina PUC Campinas.