O fato de que o agronegócio, mais especificamente na sua grande porção, que é a exportação de commodities, tem sustentado a economia brasileira nos últimos anos expõe a vulnerabilidade do Brasil.

De um lado, a alta demanda de produtos pela China com vistas a garantir a segurança alimentar do seu povo coloca o Brasil como um simples “tirador de pedidos”, ou seja, a comodidade da venda garantida, mas até quando?

Qualquer balanço nesta relação coloca uma pressão muito grande no mercado produtor agrícola brasileiro, que não se observa em países dotados de parques industriais e tecnológicos que exportam produtos com alto valor agregado.

Por outro lado, tenho sustentado há algum tempo que o modelo desenvolvimentista na exportação de commodities (alguns chamam de Revolução Verde) não engloba os pequenos produtores e aumenta as externalidades ambientais locais.

A validade desta afirmação pode ser comprovada pela grande pressão que os pequenos produtores estão sofrendo em razão da pandemia da Covid-19, em que os grandes conglomerados do setor não tiveram mais capacidade e recursos para atravessar a crise.

Como conseguiram ter o acesso aos financiamentos agrícolas em primeiro lugar, somente agora, após 6 meses de pandemia é que conseguimos verificar que alguns poucos agricultores familiares conseguem ter acesso a algum tipo de programa governamental de auxílio.

Neste sentido, a despeito das considerações a respeito do modelo de desenvolvimento, o crédito rural é de suma importância para o desenvolvimento do setor produtivo, especialmente para aqueles que não têm acesso a linhas de financiamento no exterior.

Assim, precisamos olhar para alguns dados referentes ao crédito rural no Brasil. Em pesquisa realizada em 2019, a Confederação Nacional da Agricultura apontou o crédito rural como a principal demanda dos entrevistados (59,93%)

(In https://www.cnabrasil.org.br/noticias/pesquisa-o-que-voce-precisa).

Em comparação com o ano de 2019, a pandemia não afetou a liberação de recursos para o setor; vejamos:

Fonte: Bacen

* Cooperativa de Crédito, Bco. Desenv. e Ag. Fomento e Sociedade de Crédito, Financiamento e Investimento.

Neste mesmo sentido, podemos observar que nos últimos 5 anos, período em que vivenciamos o auge da crise econômica, a recuperação do setor muito grande, justificando a afirmação acima de sustento do PIB pelo setor agrícola:

Fonte: Bacen

A obtenção do crédito rural, especialmente por aqueles que mais dependem dele, possui entraves históricos que foram exacerbados com a pandemia.

A despeito das iniciativas governamentais que visam facilitar a sua concessão como, por exemplo, a Resolução 4810 do Conselho Monetário Nacional, que prorrogou automaticamente os financiamentos e flexibilizou a apresentação de comprovantes de compra de insumos e aquisição de máquinas e a Recomendação 63 do Conselho Nacional de Justiça que orienta os juízes de direito a considerar os efeitos da pandemia em contratos (considerando a pandemia como evento de força maior no caso de descumprimento dos contratos).

Ademais, há muitas iniciativas no Congresso Nacional encampadas pela chamada Bancada do Agro que tem por objetivo proteger o setor dos efeitos da pandemia.

No entanto, como mencionei anteriormente, alguns entraves para a concessão e distribuição de crédito rural mais equitativa são históricos; podemos mencionar:

Burocracia – ela pode não ser responsável por si só pela não concessão, mas, sem dúvida pelo atraso nas liberações, o que coloca o produtor em situação complicada tendo em vista a questão do tempo para o início do plantio ou da colheita.

Questões ambientais – uma produção agropecuária sustentável que possa ser financiada implica na racionalidade dos processos e seus custos. A legislação ambiental no Brasil, embora tenha se aperfeiçoado nas últimas décadas, ainda padece de um problema crônico: os três níveis de produção (federal, estadual e municipal) legislativa, que em muitos casos causa conflitos de interpretação e entraves, aumentando o tempo de expedição de licenças ambientais e aumentam os custos.

Sem as exigências ambientais satisfeitas, não há como conceder o crédito, especialmente quando se tenta flexibilizar a entrada de investimentos estrangeiros, cujos acionistas e controladores certamente verificarão o cumprimento destas questões.

Título da terra – esta exigência atinge principalmente os pequenos e médios produtores, que dadas as sucessivas reformas agrárias e planos de desenvolvimento, se encontram em situação limítrofe e não conseguem apresentar o titulo da terra, ainda que ainda esteja na posse do imóvel por um bom tempo.