A pergunta aparentemente simples revela, por assim dizer, certo desejo por parte do sujeito de se livrar de seus sofrimentos através do processo analítico. Mas será mesmo? O que de fato ocorre com a grande maioria das pessoas que procuram um analista para alcançarem a “cura de seus sintomas”? Coloco entre aspas devido a uma certa dificuldade de definir do que exatamente se trata o sintoma e se é possível sua cura. A resposta não é tão simples como parece. Vamos lá então. Estamos aqui falando da grande maioria dos neuróticos e não das estruturas mais complexas como a Psicose.
Tendemos a acreditar que quando alguém procura um analista é porque quer resolver seus problemas, suas dores e sofrimentos, e a demanda pode de fato ser a busca de um alívio desses sintomas; seja uma melhora no relacionamento, no trabalho, na família, etc., mas o que está em jogo na maioria das vezes é o desejo secreto, inconsciente, de gozo, e aqui chamamos de gozo não o prazer puramente sexual, mas uma certa satisfação de prazer (ou desprazer) diante daquilo que ficou convencionado como sintoma, e tudo o mais que se relaciona a ele.
Mas queremos de fato nos livrar de nossos sintomas?
Como exemplos, podemos citar aquele relacionamento que só nos faz sofrer, porém insistimos com ele, aquele emprego ou profissão que já não faz sentido, mas nada fazemos na direção de uma mudança, um certo isolamento das pessoas ou o constante “não” a novos relacionamentos ou novas experiências, as insônias e angustias que nos paralisam em processos depressivos e que nos aprisionam em nosso próprio mundo, a dependência em medicamento, etc., etc.
Tais situações não dizem respeito somente ao nosso consciente (portanto ao nosso controle), mas sim ao nosso inconsciente, aquela instância psíquica que guarda os elementos recalcados de fases anteriores de nossa vida.
Precisamos pensar que nossos sintomas de alguma maneira nos fazem gozar. Lacan usou o termo gozo para se referir àquela satisfação, de prazer ou desprazer, que ocorre no inconsciente, diante das situações de nossas vidas orquestradas por nossos sintomas.
Essas situações de alguma forma trazem uma satisfação e a sua repetição tem como objetivo a sua perpetuação. Um grande investimento de energia é efetuado nesses comportamentos sintomáticos de forma a manter as coisas como são, e que normalmente o indivíduo se recusa a abrir mão.
Na maioria das vezes quando o sujeito procura análise é porque algo ocorreu e comprometeu este gozo e por isso uma angústia se instaurou.
Dizem inicialmente querer uma mudança, o que de fato pensam querer conscientemente, mas na verdade, inconscientemente gostariam de restaurar as coisas do jeito que eram, e assim voltar a ter aquela satisfação perdida de volta, e quando percebem que o que está em jogo é um abrir mão desse gozo, tendem a querer abandonar a análise. E é justamente aí que o analista deve demonstrar seu desejo de que o sujeito continue a análise e volte na próxima sessão. Por isso o processo analítico é difícil e doloroso, pois faz a pessoa ficar de frente com seus próprios desejos e a adotar uma postura de responsabilidade sobre eles.
Obviamente estamos falando de processos inconscientes, cuja descoberta se faz pelas técnicas de associação livre, análise de sonhos, atos falhos e chistes, e através do adequado manejo feito pelo analista das resistências do sujeito em análise.
Diferentemente das abordagens comportamentais, o foco da psicanálise está no descortinar do saber inconsciente do sujeito, na compreensão da história que o levou a se fixar em tais e tais sintomas, e principalmente na descoberta de seus próprios desejos, e não mais seguir os desejos do Outro.
Este grande Outro (com O maiúsculo) em termos simplistas se refere ao conjunto do que ouvimos, vimos e aprendemos através da linguagem de quem esteve ao nosso lado e cuidou de nós, da cultura, da religião, de professores, da arte, etc., e que nos remete a um lugar de desejo em nossa relação com as pessoas, do que devemos ser e de como devemos agir.
Nos libertar das amarras deste grande Outro e passar a seguir nossos próprios desejos são uma das grandes conquistas de um processo analítico.
Parabéns Sr. Paulo Russo. Excelente matéria e de extrema importância para todos nós seres humanos.
Por acaso o Sr. Também atende online, eu moro em São José//SC.
Fico no aguardo do seu retorno.
Agradeço.
Uma super abordagem sobre o tema, sanei até algumas dúvidas sobre o assunto. Parabéns Paulo pelo artigo e revista Preven pelo conteúdo de qualidade.